Page Nav

SHOW
HIDE
TRUE

Pages

/

A Morte num Beijo (1955)

A primeira das quatro grandes obras-primas de Robert Aldrich é também sua primeira incursão fora do gênero westerns, que o consagraria. Para...

A primeira das quatro grandes obras-primas de Robert Aldrich é também sua primeira incursão fora do gênero westerns, que o consagraria. Para tal filme, ele acaba por escolher o Noir como tema, enredo, gênero, estilo ou sejá lá como o filme Noir se caracterize. Apenas a terceira obra do cineasta, mas já com uma maturidade invejável por muitos diretores experientes, em A Morte num Beijo, Aldrich constrói uma aventura completamente surreal se utilizando de elementos tais quais violência forte, linguagem vulgar, personagens excêntricos e um estilo marginal para construir sua crítica á Guerra Fria, tema recorrente nos filmes feitos durante os anos 50, tais como esse. Se em 1960, Alfred Hitchcock e seu Psicose chocaram a todos ao matar a protagonista com menos 40 minutos de projeção, o que dizer desse filme feito 5 anos antes no qual a protagonista morre com réles 10 minutos de filme para não mais retornar a não ser em citações indiretas? Essa é apenas uma mera demonstração da segurança e da ousadias apresentadas de modo brilhante por Aldrich na construção de tal obra ímpar. Os créditos iniciais, transcorridos de baixo para cima já deixam claro o tom totalmente surreal e alternativo que o filme irá tomar. Logo nesse primeiro momento, notamos que A Morte num Beijo não se trata de um filme qualquer. Uma mulher, Christina Bailey interpretada por Cloris Leachmann, corre por uma estrada fugindo de algo e vestindo apenas um sobretudo. Do que ela foge, quem ela é ou de onde ela vem não se sabe. Em busca de ajuda, ela se joga na frente de um carro. Atrás do volante de tal carro se encontra Mike Rammer, interpretado por Ralph Meeker, um detetive particular que aceita dar carona à jovem desesperada. Ele percebe que há muito mais gente atrás dela do que deveria, mas aceita dar cobertura à ela. Isso até que seu carrado é bloqueado em uma estrada e ambos são levados à um cativeiro. Lá, Christina é torturada até a morte enquanto Mike é apenas mantido desacordado. Após o tal, ambos são postos de volta no carro que é atirado em um abismo. Porém, Mike sobrevive e após duas semanas no hospital, resolve investigar quem era aquela mulher e como ela chegou ao seu encontro. Como em todo filme Noir, aqui temos uma estética detalhada, um herói amoral (tanto que não hesita em torturar suas "testemunhas" quebrando discos de ópera raríssimos ou esmagando suas mãos com uma gaveta, muito pelo contrário, até demonstra certo prazer nisso, demonstrando um possível lado sádico), uma femme fatale, bandidos, mistérios e uma história lançada em direção do público de uma tacada só. Do mesmo modo em que Mike é lançado de surpresa em meio à um mistério, nós somos lançados de surpresa à uma história que já vem de pernas abertas apenas esperando para que nós a adentremos. E conforme vamos adentrando no filme, somos expostos à um desfile de bizarrices dignas dos circos de horrores europeus do final do século XIX. Espiões, baderneiros, líderes do crime, capangas, agentes federais e todo o tipo de figura imaginável passam por esse espetáculo, enquanto nós, réles espectadores e agentes passivos, somos pressionados cada vez mais contra a poltrona mediante a pressão a nós imposta por tais figuram. E em meio a essa orgia dantesca, Mike Hammer abre caminhos a socos, tiros e mortes, conseguindo cada vez mais chegar perto da solução do enigma e despertar a ira de seus inimigos, gerando uma bola de neve colossal. Quando acha-se que nada mais pode acontecer, eis que surge uma caixa-preta que consistiria na solução de toda a epopéia por Hammer travada, contendo uma colossal fonte de energia que poderia ser qualquer coisa, desde urânio ou plutônio puros até a própria cabeça da medusa. Tal aparição que deveria assumir o papel do Deus Ex Machina do filme, acaba por, propositalmente, apenas inserir mais perguntas que viriam a ditar o ritmo dos 15 minutos finais e surreais que caracterizam tal como um dos melhores finais da história do cinema, mesmo deixando muito mais perguntas do que respostas. Em A Morte num Beijo temos um Robert Aldrich com a identidade artística e seu nome como cinesta consolidados, após ter revolucionado o western no seu filme anterior. Aqui, ele apenas ratifica sua genialidade, portando como uma criança deliciosamente sádica a brincar com aquilo que tão bem conhece. A imagem final que se têm é que Robert Aldrich é a criança, A Morte num Beijo é a lupa e nós somos as formigas.