Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club, 2013) é um filme sobre principalmente a sociedade de uma época com enfoque de quem a enfrentou....
Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club, 2013) é um filme sobre principalmente a sociedade de uma época com enfoque de quem a enfrentou. Antes de mais nada, trata-se também de um filme sobre redenção de valores, em um Estados Unidos onde se cultiva desde as grandes cidades até o interiorzão, o machismo, homofobia e os grandes males que atualmente voltam ou melhor finalmente são discutidos, com alguma liberdade.
É claro que Dallas Buyers Club é um filme acadêmico desde o princípio, até por que, ao contrário da especulação da grande maioria sobre a encarnação dos atores em seus personagens (Matthew e Jared em Ron e Rayon), que realmente é o grande destaque do filme, a proposta de Jean Marc-Valeé é muito mais discutir um determinado tempo e uma sociedade do que a vida, especificamente, de suas personagens. Por isso, existe aí, mais uma escada utilizada por meio destes para se criar uma crítica e atualizar um assunto que se repete e que agora está sendo levado em conta.
A princípio, existe o certo aprofundamento em Ron, nosso guia, protagonista que move o filme. Estamos encabeçados numa estreita e difícil situação, um homem machista e tosco tem agora aquele tal negócio de HIV, “coisa de viado”. Valeé, se utiliza no primeiro ato do filme para então encaixar muito mais a vida da própria personagem e a equação que agora ela deverá enfrentar, porém, a partir daí somente encontramos a mesma narrativa lá pelo final onde voltamos ao mesmo ponto de chegada. Interessante observar que enquanto Valeé se usa dessa narrativa, para a construção de sua personagem, temos aí um interessante andamento, onde o espectador esta ali e acompanha a infeliz situação de Ron, estética semelhante a de Aronosfky, não a de Réquiem para um Sonho (Requiem for a Dream, 2000) mas sim a de O Lutador (The Fighter, 2008), de um maduro envolvimento, sem se tornar apelativo ou pretensioso, buscando esse encontro com a personagem e seu problema de forma a haver um acerto de contas com o que lhe fez bem e agora trouxe as consequências ruins. É nessa fase que sabemos quem é aquele texano homofóbico que estamos acompanhando, seus valores – ou a falta deles - que agora estavam sendo postos contra si na parede, teria que enfrentar seus próprios erros e pecados.
Quando da chegada de Rayon, a outra estrela do filme, temos aí então a quebra dessa narrativa, desse enfoque, praticamente passamos para um outro objetivo, o mercado de drogas. O didatismo inserido por Valeé logo no início da película sobre o medicamento, que havia se mostrado leve e apenas informativo, vem agora para inserir a representação de uma sociedade (da década de 80) diante do problema da AIDS, que definitivamente não pode voltar. A partir daí, não acompanhamos mais Ron, o cara que acabou entrando nessa grande equação, praticamente por acaso, mas sim de Rayon, ou mais especificamente de quem sofreu para conseguir os tais medicamentos. O discurso que era subjetivo, que colocava uma problemática para um único personagem, adquire então o formato quase documental e objetivo de toda situação. Deslocado, o espectador assim como Ron, agora é apenas mais um naquela multidão de gente que com todas as suas forças buscava algum jeito de continuar vivo. Aquele pequeno conteúdo informativo no início se torna em um cansativo discurso sobre drogas, que embora equilibrado e bem amarrado, não deixa de ser clichê e excessivamente tedioso, um discurso geral que se confunde, atropela o outro que havia construído até então, que só insere o que já sabemos, o que temos ideia de forma previsível e banal.
Os cortes bruscos, rápidos que se mostravam em uma empolgante narrativa frenética do vício que agora se agravaria ou tencionavam a mostrar uma outra linha de raciocínio, de fato, acontecem. Porém, é neles que esta o grande mal, que torna Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club, 2013) extremamente acadêmico, que praticamente se garante apenas pelas atuações – ou melhor, entregas de Jared Leto e Matthew McConaughey – por que afinal se esconde, de maneira bem digna até, mas não eficaz, que de fato é acima de tudo um filme acadêmico sobre a AIDS nos anos 80.