Johnny Vai à Guerra (1971)

É possível um filme sobre uma guerra conseguir ser interessante mesmo não mostrando cenas sangrentas de batalha? Depois de se ver "Johnny Vai à Guerra", a resposta é "sim".

Johhny, um jovem soldado americano está lutando na Primeira Guerra Mundial, quando sofre um terrível acidente: ao tentar escapar dos tiros inimigos, ele salta para dentro de uma trincheira, no mesmo instante em que uma bomba a atinge. Mutilado, ele é levado a um hospital militar, onde os médicos o mantem vivo para estudar o seu caso e analisar possíveis tratamentos a casos como o dele. Mas, na explosão, ele perde os dois braços, as duas pernas, e parte do rosto: olhos, nariz, boca, ouvidos. Cego, surdo, mudo, apenas "sentindo" o que se passa a sua volta e tentando compreender o que aconteceu, ele tenta achar uma maneira de conseguir o que parece impossível: comunicar-se com os médicos e enfermeiras.

Primeiro e único filme dirigido por Dalton Trumbo, também escritor do livro que deu origem ao filme (e publicado em 1939). O filme mistura sequências em preto e branco (as passadas no hospital) e coloridas (lembranças, sonhos e pensamentos de Johnny) e cria uma atmosfera aterrorizante sobre as inúmeras vítimas desconhecidas das guerras. A figura de Johnny representa uma metáfora de todos os soldados anônimos que perderam a vida na guerra: afinal, no hospital, ninguém sabe o seu nome, e o tratam como se fosse nada, pois estão certos de que ele não tem mais nenhum tipo de consciência. A questão é: como mostrar a todos que você está vivo quando você não pode mais se comunicar?

Sempre que vejo o filme, algumas questões me vêm à mente: como fazer para conseguir medir o tempo, por exemplo? Afinal, não há como saber, ao acordar, por quanto tempo ele dormiu, se apenas alguns minutos ou horas. Ou então, como se aliviar de alguma incômoda coceira nas costas, se você não tem braços nem pernas e nem consegue avisar a ninguém do que está acontecendo? Depois de muito refletir, cheguei à conclusão de que muitos enlouqueceriam nesta situação. E louco é o que Johnny vai se tornar, se não conseguir achar um meio de se comunicar e transmitir uma mensagem à enfermeira: "Por favor, me mate. Prefiro morrer a viver assim!". Sinceramente, quem não gostaria?

Este é um filme absolutamente necessário, um filme que retrata de maneira atroz os horrores de uma guerra. Talvez muitos digam que o filme é exagerado, e que ele jamais sobreviveria à explosão. Concordo em partes: o que o filme propõe é justamente pegar tudo o de ruim que pode acontecer a uma pessoa numa guerra, e colocar tudo numa única pessoa. Assim, o sofrimento de Johnny representa o sofrimento de todos. Por isso, tanto sofrimento a uma única pessoa.

O final é brilhante, e terrivelmente cruel. E, na minha opinião, um dos melhores finais que já vi, verossímil e não apelativo, como o próprio filme.

PS: em Portugal, o filme foi lançado com o título "E Deram-lhe Uma Espingarda". Se alguém entendeu, favor, deixe uma mensagem me explicando...

PS2: "Johnny Got His Gun" era o slogan usado para convocar jovens norte-americanos a se alistarem nas forças armadas no final do século 19 e início do século 20. Essa frase foi popularizada na canção "Over There", de George M. Cohan, gravada em 1914. E cenas do filme foram usadas no clipe "The One", do Metallica, o que ajudou a popularizar o filme recentemente.


JOHNNY VAI À GUERRA (Johnny Got His Gun, EUA, 1971). 
Direção: Dalton Trumbo. 
Elenco: Timothy Bottoms, Diane Varsi, Jason Robards e Donald Sutherland. 
Duração: 106 minutos.

Postagem Anterior Próxima Postagem
Post ADS 1
Post ADS 1