Os Noivos (I Fidanzati, 1963) é um filme de tiro curto. Escrevo isso me referindo ao seu tempo e até ao seu enredo. São 77 minutos rápidos que contam uma breve parte da vida de Giovanni (Carlo Cabrini), um jovem que muda de cidade por uma oportunidade de emprego definida por ele como “única”. Para tal ele se vê obrigado a deixar seu pai num asilo e sua noiva Liliana (Anna Canzi) para trás, tentando manter o relacionamento à distância. Os Noivos é daqueles filmes que curtos que permanecem por dias nos nossos pensamentos.
Os créditos iniciais são apresentados enquanto presenciamos um baile dançante sendo organizado e depois acontecendo. Através de flashbacks, que continuam durante todo o longa, o diretor Ermano Olmi deixa o espectador a par da história. A jovem que está sentada num canto de cara amarrada e não quer dançar com ninguém é Liliana. O homem que tenta lhe agradar é Giovanni e estes são os últimos momentos dos dois juntos antes da partida dele.
Saindo de Milão, a metrópole, Giovanni se transfere para a Sicília, que mistura interior com cidade. O jovem sente essa mudança logo ao chegar ao seu destino. Na cena em que os gerentes da indústria o buscam no aeroporto e, em seguida, quase atropelam um velho de carroça na rodovia, mostra o conflito entre o urbano e o rural. Isolado e vivendo num pequeno quarto, Giovanni percebe que o emprego não é tão bom quanto ele esperava. Aliás, sua atividade no emprego praticamente não tem espaço no filme, Olmi se dedica a mostrar o jovem em seu tempo livre, caminhando pela cidade e se envolvendo com outra mulher, que claramente não tem nenhuma importância para ele. Giovanni não consegue estabelecer nenhuma ligação com as pessoas dali, sendo distante em qualquer conversa, que sempre parte dos outros, nunca dele.
A solidão leva o homem ao questionamento. Giovanni pensa, lembra-se de sua cidade, de sua noiva e de seu pai, mas nunca conseguimos nos adentrar em sua mente. Giovanni nos repele, assim como o faz com as pessoas a sua volta. Só temos lugar para observar seu descontentamento e sua busca por algo, que ele esconde num lugar onde ninguém pode chegar. Enquanto isso o protagonista passeia sozinho pela cidadezinha.
Trazendo o passado através de flashbacks, Olmi mostra as conversas que o casal teve quando o noivo noticiou sua partida. O relacionamento, que passava por uma crise, está a ponto de acabar com a partida do homem. Através de cartas, porém, a relação dos jovens perdura e até se fortifica, como a própria Liliana fala em certo momento. A rotina da companhia um do outro fora quebrada e isto reascendeu sua cumplicidade.
Não é só a narrativa arrojada de Os Noivos que chama a atenção. Sua bela fotografia em preto e branco se destaca facilmente. A beleza de cada quadro, focando muitas vezes os rostos e traços dos atores, é impressionante. A arquitetura industriaria da Sicília, bem como suas casinhas e ruas estreitas de pedra, compõem um cenário confortante de interior.
O sonho de um futuro melhor é o que move os trabalhadores para a Sicília. Passado logo após a Segunda Guerra Mundial, durante a época em que a Europa estava em crise, Os Noivos resgata aquele futuro incerto de indivíduos que se preocupavam apenas em garantir um teto e o que comer. O destaque é a cena no ônibus em que os empregados conversam sobre o movimento de trabalhadores que se iludem com as oportunidades criadas ali.
Obra não muito falada, Os Noivos carece de reconhecimento, seja do público ou até da crítica especializada. Fato esse que não deixa de ser estranho, devido às tantas qualidades apresentadas no longa. Perdido no tempo, o filme não deixa a desejar perante outros grandes expoentes do cinema europeu da época. O certo é que quem o assiste ganha algumas horas de boas dores de cabeça. Ou pelo menos deveria.
Giancarlo Couto