“Jornalista renomado, recém egresso de uma Europa em Guerra, Steven O’Malley decide escrever a biografia de um herói nacional que acabou de...
“Jornalista renomado, recém egresso de uma Europa em Guerra, Steven O’Malley decide escrever a biografia de um herói nacional que acabou de morrer ao atravessar numa noite tempestuosa uma ponte danificada. Ele se melindra com a recusa da viúva, mas por um motivo ignorado ela acaba cedendo e deixa que se aproxime. Ela não parece satisfeita e demonstra, no entanto, que não deseja cooperar plenamente. Que mistérios rondam o comportamento dela e dos que cercavam Robert Forrest?”
Visão lírica, irônica e paradoxal de uma América que se nega a entrar no conflito mundial (Segunda Guerra), mas que recebe seus reflexos no próprio solo. Cukor passeia por vários gêneros com seu toque suave pinçado por enigmas que fascinam. A vida de um homem é reconstruída em várias tonalidades. O filme flerta com Citizen Kane, mas não possui a estrutura de flashbacks, nem a profundidade do filme de Welles. Não decepciona, no entanto. Ao contrário, o reflexo está distorcido, mas a coragem de ousar é latente. Autópsia de um crime feminino ou Ato de Heroísmo? O que permanece de sua trama é uma alegoria do Americanismo trazido as telas com brio exemplar. Estruturalmente conduz ao aumento em espiral dos mistérios, ancorado em diálogos que não explicitam o que ocorre, em que o não dito fica a dançar freneticamente na mente de quem assiste. O próprio lugar em que residia o falecido, se assemelha a uma fortaleza, fechada para o mundo, mas que simbolizava as esperanças de vários patriotas, temerosos do que se passava no velho mundo. Capra já tocara no tema um ano antes em “Adorável Vagabundo”: Forrest também ficara fascinado pelas ideias fascistas e imagina a construção de um regime diferente em solo americano. Quando se idolatra um indivíduo o perigo é claro.
A equipe de jornalistas que ali se encontra, não visava a descoberta da verdade, nem o próprio Steven. O que queriam eram mais dados para enaltecimento daquele que se foi. A jornalista que se encontra no local, não serve somente de alívio cômico para a trama. Em realidade ela nos alerta para o calcanhar de Aquiles do pretenso herói: O medo do amar. Medo esse substituído pelo amar, quando se dá conta do sacrifício daquela que estava prestes a caluniar.
De qual chama o filme fala. Daquela causada pelo luto nacional? Daquela envolta na dor individual que acomete cada um? Do amor pelo país? Daquela que por um ato errôneo visa salvar a todos de um destino pior? Aquela que luta contra a ameaça da infidelidade que pairaria sobre os lares americanos vinda a Guerra? (Seria a mulher adúltera, e estaria tendo um caso com um primo mais jovem e belo? O seu surgir diante de nossos olhos pela primeira vez em trajes claros, visava nos ludibriar?). Ou sempre ela foi uma sacerdotisa a proteger a memória do marido, do próprio abismo em que se atirava, sacrificando-se a si própria, ao encher de sangue as próprias mãos?
Devemos nos lembrar que a lei americana vetava que a mulher testemunhasse contra seu marido num julgamento.(Tema recorrente em Bola de Fogo (1941) de Howard Hawks, onde um gangster quer se casar com uma corista para calá-la). Aqui não estaria se transferindo a mesma ideia para que uma viúva, continuasse fiel a figura do morto, mesmo com seu próprio sacrifício.
Qual o verdadeiro Fogo Sagrado? Só ficamos sabendo ao término do filme. É aquele da mulher retratada, que em silêncio, a custa do seu próprio sacrifício, longe dos holofotes, ergue sua defesa contra a tirania que pode assolar o mundo. Nesse caso aqui ela foi retratada para o mundo, mas a história é pontuada pelos milhões de exemplos que morrem escondidos em todos os cantões do orbe.
Escrito por Conde Fouá Anderaos