Senhores do Crime (2007)

“Anna é uma parteira em um hospital londrino. Na noite de Natal, ela recebe em seus braços a criança de uma adolescente que entra em trabalho de parto. No mesmo instante em que a criança nasce, a mãe falece, devido um ferimento adquirido em circunstância misteriosas. Decidida a colocar a criança em segurança, Anna procura pistas sobre a mãe, em um diário que a mesma portava. Uma barreira insuperável a espera: a adolescente era russa, e Anna apesar de sua descendência não domina o idioma. Crendo que seu tio não dispõe a tradução, ela procura o apoio de Semion (Armin Mueller-Stahl). Ao buscar a ajuda ela entra em um pesadelo do qual só sairá com a ajuda de quem menos se espera ...

O cinema de Cronenberg jamais me decepcionou. Longe estava, porém de me empolgar, mais ao menos possuía algumas qualidades que o tiravam do lugar destinado a filmes comerciais. Agora parece que ele abandonou aquele medical-horror sem, contudo deixar o argumento que parece mover seu cinema. Aqui em “Senhores do Crime” temos novamente o velho tema de parasitas que passam a atacar um corpo até conseguir dominá-los. O Corpo no caso é Londres, e os parasitas são os mafiosos russos. Uma Londres, diga-se de passagem, moderna. E também uma cidade mais tenebrosa e cinzenta que dantes.

Parece que Cronenberg renunciou ao imaginário tecnológico monstruoso que compunha seu estilo. Ele abraça a idéia de que a maior violência é aquela que impomos a integridade física de um corpo. Na atmosfera chuvosa de Londres se instala uma história de família violenta e visceral. Violações e assassinatos com as mãos nuas se multiplicam na história. Anna sem o saber mergulha nas raízes da máfia russa. Os personagens que ali desfilam despertam grandes interesses. Kirill (Vincent Cassel) é um jovem herdeiro de um mafioso. Notamos que em comparação com o pai ele é risível. A violência que dele emana nada mais é que uma poderosa atitude de defesa diante do império que ele terá de comandar e para o qual ele não possui capacidade para tal. Nikolai, o motorista de Kirill é um homem que prova possuir uma inteligência e capacidade visionária bem superior a de seu “mestre”. O interesse da história é de se identificar o mistério de quem realmente é Nikolai. Descobrir o que está escrito em seu corpo, que desde o início soa ilegível para nós. Jamais sabemos o que o motiva, parece que sempre ele está acima dos sentimentos e das sensações. A maneira como ele se entrega no ato sexual é mecânica e vazia. Não existe prazer naquele ato, somente o dever de cumprir uma obrigação. Deparamo-nos com um personagem que não pode ser visto como um herói, já que ele não pode ser movido por nada exterior. Sabemos que ele é uma máquina de morte, mas não sabemos o que pode causar a detonação de tal. Não existem espaços no filme para uma história de amor, já que o caminho trilhado por Nikolai lhe fechou as portas para uma vida familiar. Anna é apenas uma porta fora de seu alcance, uma promessa furtiva de família, de ligações calmas e felizes. Para se impedir que os ventos insalubres que sopram do leste desde a queda do muro invadam o solo europeu, é necessário que um homem renuncie a idéia de viver. Ele terá de ser uma máquina a serviço do bem. É necessário se sujar para poder realizar uma esterilização dentro da máfia. Criar um personagem tão complexo não é tarefa das mais fáceis. Viggo Mortensen se firma como um dos grandes atores em atividade. Sua criação é perfeita. E ele se destaca em um elenco onde ninguém falha.

Cronenberg parece se encaminhar rumo a realização de obras maiores. Esse filme e o anterior (Marcas da violência) nos fazem crer que obras melhores virão. Espero que tal se confirme, mas o que nos foi apresentado já é de bom tamanho.


Escrito por Conde Fouá Anderaos, em 18/12/2010.

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