“Durante uma ronda noturna que acaba mal, dois policiais ferem com um tiro um jovem drogado (filho de um deputado) que acabara de matar um de seus companheiros. O jovem após sair do coma, acusa-os de abuso policial (estava na sua residência e foi perturbado). Para provarem sua inocência eles resolvem investigar por conta própria quem distribui ou fabrica a droga química responsável pelo descontrole do agressor.”
A história em si é comum: o surgimento de uma nova droga que aumenta a agressividade, uma batida policial que acaba mal, um mergulho no meio dos narcóticos na demanda de seus criadores e distribuidores. Apesar dessa trama, trata-se de algo ao menos “assistível”. Não se vê aqui o correr desenfreado dos filmes estadunidenses, e quando o mesmo ocorre está dentro de um equilíbrio e lógica. Os personagens também são bem construídos, ainda que muitos sejam desinteressantes. A dupla central é formada por uma policial que esconde sua feminilidade atrás de um uniforme e um policial impulsivo que foi transferido devido sua agressividade. Apesar de suas limitações, quando aquilo que os sustenta (o uniforme) é ameaçado, eles se apegam naquilo que lhe resta de honra e partem para salvá-la. E a forma como realizam isso, no limite entre o certo e o errado, é que nos prende ao filme. O caminho percorrido em busca dessa salvação pode ser o começo da perdição. Eles se percebem como peças de uma engrenagem que os pode descartar para manter a aparência. E ao mergulhar em busca da salvação podem encontrar a perdição.
A mensagem social é colocada de forma sutil por toda a película. Talvez por isso ela surja de maneira mais contundente, distanciada dos clichês habituais. A podridão não se restringe a um grupo social especifico e não está restrita a um espaço determinado. Por todo o lado as drogas se espalham e seus alvos são escolhidos a esmo, ainda que se focalize aqui de preferência, as altas esferas do poder. O diretor arranha rapidamente a superfície de toda a sociedade. A ação dos policiais, feita de forma pouco cuidadosa e mais emocional, resvala pouco em um idealismo. O que se busca aqui é salvar a própria pele. Não se cai na facilidade de se mostrarem seres perfeitos. Quando em um assalto a que foram chamados, um deles não se importou em furtar uma barra de chocolate. Apesar disso o norte moral é encarnado pela personagem de Cecile de France (Meu Coronel) em curto momento. Ela refutou de forma imediata o se usufruir dessa mísera barra. Mas posteriormente ela se cala, quando a hierarquia solicita e se torna posteriormente heroína sem moral.
Esteticamente o filme navega no oceano de uma composição perfeita e fria, distante mesmo de qualquer emoção mais digna. Frio, seco, a música vai da tecno ensurdecedora até o trip-hop mesclando-se com notas agudas que acabam por construir uma urbanidade desumanizada. Parece que nesse mundo criado pelo homem, o mesmo deixou de lado quaisquer resquícios da humanidade que o impulsionava a construir uma civilização. Falta um toque de delicadeza ao filme. Mas isso é uma opção que parece ter sido descartada pela direção. É como se víssemos uma autópsia de um mundo já destruído e clamássemos por um remédio o qual não pareceu preocupar seus produtores. O filme vale, sobretudo para compararmos como o cinema francês trabalha um tema que soa-nos totalmente americano. Vale conhecer.
Escrito por Conde Fouá Anderaos