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Jeanne Dielman (1975)

Embora feito por uma Chantal Akerman de apenas 25 anos, Jeanne Dielman esbanja maturidade ao retratar de uma maneira extremamente fria e des...

Embora feito por uma Chantal Akerman de apenas 25 anos, Jeanne Dielman esbanja maturidade ao retratar de uma maneira extremamente fria e desesperançosa o cotidiano de uma dona-de-casa viúva que representa de uma maneira quase que universal o enfado burguês que tantos cineastas tentam evitar. Enquanto em quase todas as obras cinematográficas existentes a montagem tem como objetivo deixar a obra mais dinâmica, limpando o filme das "partes chatas da vida", em Jeanne Dielman, Chantal faz questão de deixar essas partes, visto que é exatamente esse o tema a ser abordado na obra. O filme se consiste em aproximadamente 200 minutos de projeção compostos unica e exclusivamente por planos de câmera fixa acompanhando as tarefas do dia-a-dia da pesonagem-título, como fazer a comida, limpar a casa, checar as correspondências e jantar com seu filho adolescente. Dessa forma Chantal nos insere na vida de Jeanne durante três dias, apresentando-a a nós de uma forma extremamente íntima e, em certos pontos, quase que voyeurística. O ritmo relativamente enfadonho que prevalece no filme é essencial para o funcionamento pleno da obra. Lentamente vamos percebendo o desgaste psicológico infligido pela rotina repetitiva à protagonista, um desgaste tão sutil que com uma montagem mais ágil passaria desapercebido. Esse desgaste vem retratado na simples forma com que uma mecha de seu cabelo pende sobre sua testa ou no simples ato de deixar a tirrina destampada. Em Jeanne Dielman, Chantal usa a personagem título para criticar o vazio existencial de uma parcela das mulheres modernas, cuja vida é tão vazia ao ponto de a sua maior preocupação no dia é saber se as batatas estão no ponto ou se certo botão vai combinar com o casaco. Uma forma particularmente incômoda de retratar a futilidade da vida de sua personagem, conferindo ao filme o ar feminista tão presente na filmografia de sua diretora. Como se não o bastante, Jeanne se prostitui diariamente em sua própria casa, enquanto seu filho está na escola. Dessa forma ela financia a vida burguesa e sacia sua necessidade de prazer carnal aflorada após a morte de seu marido, que não amava. Todos elementos reforçando a ótica feminista do filme. Por conta de seu ritmo lento, Jeanne Dielman é um filme difícil de ser visto e ainda mais difícil de ser apreciado, sendo renegado à um status de filme marginalizado. Não se trata de um filme para ser assistido buscando entretenimento ou prazer, mas sim para buscar reflexão e maturidade, algo que essa obra extremamente autoral esbanja. Nas três horas de filme, Chantal consegue derrotar qualquer espectador, exceto os mais obstinados e pacientes. Espectadores esses que, após o término da exibição, serão brindados com um dos melhores e mais importantes filmes europeus dos anos 70.

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