O Concerto (2009)

A carreira do cineasta Radu Mihaileanu é consideravelmente discreta, porém, mesmo com poucos trabalhos no currículo, já consegue criar sua identidade artística, fortemente ligada à sua história pessoal, formando um tipo de cinema profundamente autoral, embora não pareça a uma primeira análise. Nascido na Romênia, celeiro de culturas na Europa, e filho de um judeu comunista, Mihaileanu fugiu para a França no começo dos anos 80 devido à ditadura de Ceausescu que se instaurou em seu país natal. Na França, acabou tendo sua entrada no cinema como editor e, posteriormente, assistente de direção de Marco Ferreri. Uma entrada bem respeitável. Tal qual sua vida induz, seus filmes estão repletos de referências, diretas e indiretas, a elementos tais quais socialismo, anti-semitismo e exílio, conferindo a eles um ar profundamente político. Em Trem da Vida temos judeus se passando por nazistas para poderem sobreviver. Em Um Herói do Nosso Tempo, judeus etíopes protagonizando um êxodo na década de 80 em busca de esperança na terra prometida de Israel. E em O Concerto, temos um maestro que monta uma orquestra às pressas para se passar pela orquestra de Bolshoi numa apresentação em Paris. "Mas o que isso tem a ver com a obra do Mihaileanu?" você pode se perguntar. "Cadê o fundo político?". Pois bem, embora oculto na sinopse, ele está bem ali, totalmente presente. O Concerto possui um enredo base já bastante explorado. Um ex-ídolo que foi derrubado de seu trono e agora vê uma possibilidade de retorno. Ou então mais até, um homem que amava sua profissão acima de tudo, mas que por motivos adversos foi rebaixado para faxineiro. Só para citar um exemplo, bastante semelhante ao enredo básico de A Última Gargalhada. Filipov foi maestro do Bolshoi só que, devido a alguns problemas políticos de ordem semita (lado político de Mihaileanu se mostrando presente), acabou sendo tirado de sua profissão e passado ao cargo de faxineiro do teatro. 30 anos depois, surge a oportunidade, por meio de um fax que ele intercepta, de reunir novamente sua antiga orquestra em uma apresentação em Paris, fazendo passar pela verdadeira orquestra Bolshoi. Começa aí uma comédia, bem aos moldes europeus (que são bastante diferentes do americano, vale ressaltar (e em europeu, não incluo inglês)) que guarda semelhanças na narrativa e no gênero com trabalhos como Soul Kitchen de Fatih Akin e Amanhã Nós Mudamos de Chantal Akerman. Uma comédia montada sobre a bizarrice dos músicos que vão sendo contratados. O riso vêm da surpresa, e somos surpreendidos pela quebra de nossos padrões pré-formados de o que esperar de um músico. Rimos de quão tolos somos. Rimos exatamente por sermos tolos. E Mihaileanu ri de nós por conta disso. Não apenas com o humor ele brinca, mas também com os clichês que estão intrísecos no espectador. Embora o enredo principal flue com certa dose de previsibilidade, é nas tramas paralelas que esse jogo de clichês se constrói, sobretudo quando se põe em xeque a questão da paternidade de Anne-Marie Jacquet, a ilustre solista convidada para integrar a orquestra. Mihaileanu induz o público a tomar uma conclusão precipitada tendo como base meramente os clichês a que está acostumado. Tanto que em nenhum momento há argumentos verdadeiros que comprovem essa falsa interpretação a que somos induzidos. Um trabalho bastante interessante, onde nos vemos sendo manipulados. Como não poderia deixar de ser, tudo conduz para o ato final, onde finalmente nos vemos diante da apresentação, um tanto semelhante à de O Segredo de Beethoven, da Agniezka Holland. Por meio de um tipo de montagem paralela (elemento não presente no filme de Holland), mas distinta da que estamos acostumados, vemos a apresentação juntamente do passado das personagens. Um momento no qual as lágrimas insistem em cair, embora talvez menos devido a Mihaileanu e mais devido a Tchaikovsky em si.

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